Modos de cambiar afetos

São inúmeros os pesares sobre a falta de diálogo entre a música produzida no Brasil e dos outros países da América Latina. Mesmo havendo ao longo dos anos vários exemplos de trocas entre artistas e produtores, há uma sensação, pelo menos de minha parte, que essa troca pudesse ser mais numerosa. No Recife, o Festival Rec-beat é quem tem programaticamente recebido em suas edições artistas latino-americanos. O processo de curadoria do festival tem incluído a ida a festivais de música e a encontros que procuram refletir sobre essa produção. Mais recentemente, ainda em setembro, o curador do Rec-Beat, Gutie, esteve no Imesur, um encontro realizado nas cidades de Santiago e Valparaíso, no Chile, com produtores e agentes culturais do Brasil e Chile. Assim como o Rec-Beat, representantes de outros festivais, como o DoSol e o El Mapa de Todos, que tem apostado em suas curadorias nesse intercâmbio entre artistas latinos, também estiveram presentes no encontro. Um outro pesar, no caso específico de Pernambuco, foi o do cancelamento do Porto Musical por falta de patrocínio, que ocorreria em 2017.

No entanto, entre esses pesares e a presença da música como diálogo entre países da América Latina e suas estéticas distintas, dois novos projetos musicais reforçam essas trocas e estão em plena atividade, são eles, o Ladama e o Capibaribe de La Plata.


O grupo LADAMA, formado por Lara Klaus (Brasil), Daniela Serna (Colômbia), Mafer Bandola (Venezuela) e Sara Lucas (Estados Unidos) está em sua terceira turnê, de setembro a novembro, nos Estados Unidos. O grupo apresenta seu primeiro álbum homônimo. Segundo o grupo, elas procuram “ressiginifcar estilos da América do Sul e do Caribe como a Cumbia, Maracatu, Onda Nueva e Joropo, e misturando-os com Soul, R&B e pop […]”. A pernambucana Lara Klaus complementa: “Somos profundamente inspiradas pelos ritmos e tradições da nossa terra natal. Me sinto ainda mais conectada com meus antecedentes e nossos ancestrais indígenas e africanos trabalhando com as meninas. Desde a primeira vez que tocamos juntas, senti uma mudança palpável na maneira como eu me relaciono com a música e vejo isso como uma poderosa ferramenta, sendo capaz de energizar as pessoas através de minha música, além de transformar algo nelas”.

LADAMA_PressPhotos_2017. ©KevinBay.

As musicistas se conheceram no OneBeat, durante uma residência artística com curadoria do Found Sound Nation, que envolveu além da produção musical e composição também projetos de cunho social e educacional.

“porro maracatu” é justamente esta justaposição entre ritmos e linguagens – nesse caso, a colombiana e a brasileira-pernambucana – com forte ascendência dos vocais e rítmicas o tempo todo em diálogo, como se a própria canção se revelasse como um manifesto artístico do que essa junção de estéticas quer tornar visível.

Já nas cidades do Recife e Olinda acontece a partir da terça-feira, no Sexto Andar, Edf. Pernambuco, o projeto de intercâmbio musical Capibaribe de La Plata, com incentivo do Funcultura e idealizado pelas produtoras Mery Lemos, Laura Proto e Renata Gamelo. O grupo argentino Ensamble Chancho a Cuerda fará uma série de apresentações e encontros com os músicos pernambucanos Juliano Holanda, Zé Manoel, Isadora Melo e Rafael Marques.

O Outros Críticos foi convidado para mediar a primeira atividade do grupo na cidade, um debate juntamente com os músicos pernambucanos que formam o quarteto Capibaribe de La Plata, que depois das atividades-shows em Recife e Olinda, seguirão o intercâmbio com apresentações com o Ensamble Chancho a Cuerda na Argentina.

Formado em 2006 pelos músicos Manuel Rodríguez Riva (clarinete, clarón e harmônica), Lautaro Matute (violão, guitarra, bandurría e voz), Nicolás Rallis (guitarras, ronroco e voz), Joaquín Chibán (violin e viola), Julián Galay (contrabaixos), Nahuel Carfi (pianos, sintetizador e voz) e Agustín Lumerman (bateria e percussão), o grupo acaba de lançar um single com temas instrumentais que antecipam o 4º álbum do septeto.

Abaixo, a programação completa das atividades do Capibaribe de La Plata:

26/09| Coletivo Sexto Andar (Edf. Pernambuco – Av. Dantas Barreto 324, 6o andar) – Entrada Gratuita e sujeita a lotação do espaço
18h -Roda de Conversa sobre empreendedorismo musical com Juliano Holanda, Nahuel Carfi e demais integrantes do projeto com mediação Carlos Gomes (Outros Críticos)
20h – Pocket Show da Ensamble Chancho a Cuerda

27/09| Pequeno Latifúndio (Rua Gomes Pacheco, 426, Espinheiro, Recife) – Ingresso R$ 20
20h – Pocket Show de Nahuel Carfi, Juliano Holanda, Nicolas Rallis e Lautaro Matute.

28/09| Restaurante Mingus – Couvert R$ 15,00
Show de Nahuel Carfi

29/09| Casbah/Olinda (Rua 27 de Janeiro, Carmo, Olinda) – Entrada Gratuita e sujeita a lotação do espaço
20h – Jam session do Ensamble Chancho a Cuerda + Capibaribe de La Plata e músicos convidados

30/09| Paço do Frevo – Ingressos: Acesso comum ao Museu R$ 8 (inteira) e R$ 4 (meia entrada)
16h –  Show do Ensamble Chancho a Cuerda + Capibaribe de La Plata 

Foto de capa: Ensamble Chancho a Cuerda

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Carlos Gomes Escrito por:

Escritor, pesquisador e crítico. É editor dos projetos do Outros Críticos, mestre em Comunicação pela UFPE e autor do livro de contos "corto por um atalho em terras estrangeiras" (2012), de poesia "êxodo," (CEPE, 2016) e "canto primeiro (ou desterrados)" (2016), e do livro "Canções iluminadas de sol" (2018), um estudo comparado das canções do tropicalismo e manguebeat.

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