A música percorre um caminho de inquietação e reverência à palavra e aos sons delirantes das ruas. As relações de poder contaminam os espaços com o desejo explícito de segregar o que não cabe no gesto, nas cercas, nas noções de normalidade. A rua é viva e sem centro. A música é marginal, anormal, louca e deslumbrante. No entanto, torná-la marginalizada com ares de Política Cultural é uma das maiores violências que se pode cometer contra ela. Poeta. Mestre. Maracatuzeiro.…
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.Anganga, o novo trabalho do músico Cadu Tenório em parceria com Juçara Marçal, é como uma voadora de pés juntos bem na ‘caixa dos peitos’. São oito faixas criadas a partir de uma investigação conceitual que funde a experimentação sonora ao resgate de forças culturais oriundas da passagem entre os séculos 19 e 20. Devastadora, a sonoridade ruidosa do álbum evoca o transe no ouvinte, como a mão de um sacerdote católico ortodoxo que mergulha a cabeça do fiel repetidas…
Há no mundo de hoje inúmeros elementos de distração. No seu enfrentamento diário da realidade, o sujeito contemporâneo encontra-se imerso num oceano de estímulos sensoriais que se justapõem proporcionando-lhe uma gama interminável de pequenos sequestros de consciência que diluem a individualidade daquele Eu uno, centrado, cartesiano em um Outro, multifacetado e eternamente disperso. O celular está sempre a alarmar uma nova mensagem de um grupo de Whatsapp; as notificações da timeline do Facebook demandam um reiterado e compulsivo passar de…
por Rafael de Queiroz. Não há exageros ao se afirmar que A Mulher do Fim do Mundo (2015) já nasce essencial. Visceral, impacta; a originalidade, surpreende. Não há como passar batido, despercebido no rio lamacento, e claro, insosso, que banha a MPB mais tradicional. Sendo um ícone do gênero, nos seus quase 80 anos de idade, Elza Soares poderia estar lançando um disco de grandes sucessos do samba, regravando, escorada numa preguiça comum dos consagrados, ou pior, interpretando novos artistas…
Nazaré da Mata, Pernambuco, De Baile Solto. O músico Siba conversa com policiais militares durante uma noite de ensaio do Maracatu Estrela Brilhante de Nazaré da Mata, do qual o artista faz parte, na tentativa de convencê-los a seguir com a festa até o amanhecer, como sempre fazem, tradicionalmente, as sambadas dos maracatus, já que a intenção da polícia era a de interromper os ensaios às 2h da manhã. Apesar de conseguirem ir até o sol nascer nessa ocasião, outros…
por Marina Suassuna. Em 1965, Elis Regina recebia um bilhete de Vinícius de Moraes pouco antes de subir ao palco da final do 1º Festival Nacional da Musica Popular Brasileira: “Arrasta essa gente aí, Pimentinha”, dizia o poeta, autor da música “Arrastão” junto com Edu Lobo. A canção seria interpretada por Elis na ocasião e transmitida em rede nacional pela TV Excelsior. Em plena década de 1960, os festivais de música popular – ou festivais da canção – eram as…
por Carlos Gomes. É curioso que um dos heterônimos mais intrigantes de Fernando Pessoa, aquele que escreve no poema “Tabacaria” os versos: “Quando quis tirar a máscara,/ Estava pegada à cara./ Quando a tirei e me vi ao espelho,/ Já tinha envelhecido”, tenha o mesmo sobrenome de nosso entrevistado. Tal coincidência se revela enriquecedora por Pessoa e suas máscaras-personagens, a exemplo da criação de Álvaro de Campos (ou Toshiro, no caso de Rodrigo), ter uma ligação íntima com a poética…
por Gabriel Albuquerque. O drone é um gênero de música minimalista caracterizado pelo uso de clusters e notas prolongados ao máximo, criando um som repetitivo, com algumas leves variações harmônicas. Desenvolvido na segunda metade da década 1960 a partir de artistas como Terry Riley, Eliane Radigue e principalmente La Monte Young e seu grupo Theater Of Eternal Music, a sonoridade é diretamente ligada ao mantra e ao estado de transe e meditação. O trio carioca Bemônio leva ao drone as…
.Há quem defenda que a música é a mais difícil das manifestações artísticas. Manuel Bandeira, por exemplo, afirma categoricamente que “a técnica musical funda-se em muito mais ciência que a das outras artes.” Faz sentido. Se pararmos para olhar à distância e desnaturalizarmos a relação socialmente construída entre nós e os gêneros da arte, perceberemos que a música trabalha muito mais o abstrato do que as outras vertentes da criação artística. Afinal de contas, a pintura se realiza na imagem,…
por Ruy Gardnier. Quando o DEDO começou a se apresentar no circuito alternativo do Rio de Janeiro (Comuna, Plano B, Solar de Botafogo, Audio Rebel), o som do grupo ‒ eventualmente acompanhado de alguma projeção audiovisual ‒ impressionava por sua soberba utilização da longa duração e pela construção microscópica de crescendos texturais e/ou de volume. Era uma música que funcionava na extensão, que precisava do escorrer do tempo para desdobrar suas potencialidades. A aura de mistério encontrava eco na apresentação…
por Fernando Athayde. Ruivo em Sangue, terceiro disco do produtor e compositor paulistano Gui Amabis, surge a partir de uma construção estética que alia de forma precisa a poesia à experimentação harmônica/melódica. A impressão após a primeira audição do novo trabalho de Amabis é que o músico parece ter alcançado uma linguagem singular na construção de suas composições. Se sua voz é um elemento onipresente e invariável, que usa sobretudo da palavra para mediar a dinâmica entre as canções, todo…
o artista veste máscaras – edição 9 – bimestral – outubro de 2015 DOWNLOAD GRATUITO AQUI VERSÃO IMPRESSA AQUI Expediente Edição: Júlio Rennó Projeto gráfico: Cécile Duchamp Artistas convidados: Manu Maltez / Ganjarts Jornalista responsável: Marina Suassuna (DRT 5556-PE) Textos: Carlos Gomes, Marina Suassuna e Karol Pacheco Mediação do debate: Fernanda Maia e Carlos Gomes Colaboradores: Bruno Vitorino, Fernando Athayde, Fred Coelho, Gabriel Albuquerque, José Juva e Ruy Gardnier Fotografia: Camila van der Linden Capas: “Sanguínea e carvão”, de Manu…
por Gabriel Albuquerque. A contemplação do belo, o lirismo e noções de beleza estética são critérios recorrentes na apreciação musical – “que emocionante, que música bonita!”. Caminhando na contramão desse trajeto, uma movimentação recente de músicos e bandas de São Paulo questiona essas noções convencionais, abrindo novas possibilidades para o degastado formato canção. Influenciados pelos vanguardistas da Lira Paulistana do fim da década de 1970 e meados de 1980, como Itamar Assumpção e Arrigo Barnabé, as bandas Metá Metá e…